O Código das Sociedades Comerciais entrou em vigor em 1 de Novembro de 1986, e desde logo ali se disse, no preâmbulo, que este código “ vem corresponder, em espaço fundamental, à necessidade premente de reforma da legislação comercial portuguesa. Na verdade, mantêm-se em vigor o sábio mas ultrapassado Código Comercial de 1888, complementado por numerosos diplomas parcelares. A evolução sofrida pela economia nacional e internacional em cerca de um século exige manifestamente a sua actualização “.
Com efeito, embora se haja dito que o que se pretendia era reformar a legislação comercial, ainda assim, de imediato o nº 2 do artigo 2º inserto naquele mesmo preâmbulo logo diz que o artigo 35º só teria eficácia após haver sido fixada a sua entrada em vigor através de diploma legal. Obviamente, que desde então, muito se tem escrito, dito e até especulado quanto ao vazio legal existente, que de resto o deixou de ser a partir do passado dia 30 de Agosto.
Mas o que tinha de tão importante um só artigo para haver merecido, durante tanto tempo, mais de quinze anos, um especialíssimo tratamento ?
É que o artigo 35º colocou a recato todos aqueles que gerem mal, todos aqueles para quem as regras nunca são para cumprir, como sejam empresas de capitais públicos e logo por aproveitamento outras às quais até convém que e legislação tenha buracos do tamanho de carateras. Com efeito, a nosso ver, o vacio legis, provocou uma concorrência sem medida no meio empresarial, e toda a gente via e melhor sabia que assim era, mas ninguém ousou tocar na lei, ou seja, tem-se dado total cobertura às empresas que sistematicamente declaram prejuízos, sem que nada lhes acontecesse, indo mesmo para além dos limites, isto é, era-lhes permitido continuar desbragadamente a afrontar aqueles que com grande esforço vêm contribuindo para o arranjo dos orçamentos de estado.
Mas em concreto o que postula o artigo 35º do Código das Sociedades Comerciais ?
- Os membros da administração que, pelas contas de exercício verifiquem estar perdida metade do capital social devem propor aos sócios que a sociedade seja dissolvida ou o capital seja reduzido, a não ser que os sócios se comprometam a efectuar e efectuem, nos 60 dias seguintes à deliberação que da proposta resultar, entradas que mantenham pelo menos em dois terços a cobertura do capital.
- A proposta deve ser apresentada na própria assembleia que apreciar as contas ou em assembleia convocada para os 60 dias seguintes àquela ou à aprovação judicial, nos casos previsto pelo artigo 67º.
- Não tendo os membros da administração cumprindo o disposto nos números anteriores ou não tendo sido tomadas as deliberações ali previstas, pode qualquer sócio ou credor requerer ao tribunal enquanto aquela situação se mantiver, a dissolução da sociedade, sem prejuízo de os sócios poderem efectuar as entradas referidas no nº 1 até ao trânsito em julgado da sentença.
Ora, doravante empresa que não sabe ganhar dinheiro, ou por hábito engana o estado, não pode estar no mercado. E, porque é que estavam? Estavam porque se dizia que socialmente era muito negativo a sua dissolução e consequentemente o seu encerramento porquanto traria atrás de si gente para o desemprego. A nosso ver, nada de mais falacioso. De resto, a vitalidade de um país vê-se, mede-se, exactamente pela pujança do seu tecido empresarial e pela mobilidade da força de trabalho.
Não possuímos dados estatísticos na mão para o poder afirmar mas há quem haja publicado que mais de 80 mil empresas portuguesas vêm dando prejuízos há 20 anos. Nestas cabem, empresas como a RTP, a TAP e outras. Este assunto merecia um debate nacional, eventualmente na Assembleia da República, se para tanto existisse sensibilidade.
Concluindo, deve-se dizer por amor à verdade que; empresas que reiteradamente declaram prejuízos - e declarar prejuízos não é o mesmo que obter prejuízos -, devem mesmo encerrar, ainda assim, o dito artigo 35º deveria ser reformulado, pois não devem ser os membros da administração a apresentar proposta à assembleia geral, mas - sem plagiar americanices – deveria ser o próprio técnico oficial de contas que no relatório de prestação de contas aí deverá demonstrar o rácio de autonomia financeira e, desde logo, dar relato do facto a instância de direito. Por outro lado, banca que financia empresa falidas deve ficar impedida de cobrar quaisquer créditos. Por outro lado ainda e dado que o poder autárquico também está obrigado ao cumprimento da partida dobrada, deixando a conta de exploração de funcionar segundo princípio de caixa, também o rácio de endividamento este por ser complementar do da autonomia financeira, quando verificados sejam níveis de desconforto, estes a fixar, deveriam ficar inibidas a recurso a crédito.
Leiria, 28 Outubro 2001