Quinta-feira, 27 de Agosto de 2009

 

Vomecês já sabem, sou da aldeia, e de lá trouxe esta magnífica história; história ou notícia? Ali, tudo é mais natural, mais genuíno. Falar com gente da aldeia acrescenta gosto na conversa, conhecimento e prazer até, á vida. As conversas da aldeia fazem – fazia-nos – falta.

 

E, procurando colmatar o défice, um dia destes passei pela minha aldeia. Passei e parei! E logo alguém, cansado e queimado pelo tempo e pelo trabalho de sol a sol, amparado por uma muleta - antes que se fizesse tarde -, logo foi abrindo o baú. Já não nos via de há tempo!

 

-  As putas das retroses dão cabo d’um home. Fui outra vez operado, mas a coisa não vai! Estou na mesma!

E assim começou a conversa com lamentos, desabafos, considerações e conclusões.

- A coisa não vai boa, está tudo levado dum raio! E não se vêem jeitos à coisa! Os que deviam de ver, não vêm!

E lá fui ouvindo o matraquear. Mas, num fechar d’olhos já a conversa era outra.

 

- Fulano, sabes! O alma de um raio que o abrase, ganha a vida a cobrir. Ganha mais que um Ministro. Se ganha!

E decidido como estava a dizer tudo – tudo o que quisesse dizer - em pouco tempo, continuou:

- Ganha dinheiro como milho e só têm três varrascos. Vê-me bem a qualidade do bicho. E as rezas, é cá cada uma! Havias de ver! Mete-os na carrinha e lá vai ele de banda para banda, há sempre quem precise. E bota pra cá 5 contos por cada “montadela”. Isto pode lá ser!

Em notas velhas; disse eu.

- Sim! Vinte e cinco oiros novos! Vai um, vai outro! E pimba, oh pra cá!

 

A conversa ia ganhando foros de revolta, ou melhor os desabafos – do meu conversante – eram de quem estava revoltado. Às tantas procurei inverter o discurso.

- Mas porque te hás-de infernizar com os barrascos do homem!

- É quele farta-se de embolsar. E tudo sem pagar um avo. E, tu que és lá dos impostos devias de ver isto! Mas isto pode lá ser!

- Não. Não sou nada dos impostos! Pronto é como se fosses! O alma danada não paga nada, e ainda mete o “fedum” do curral lá para um poço. Mas isto pode lá ser?

 

- Está bem! Mas porque carga de àgua, estás tão arreliado com isso?

- é que agora (aí p’rocausa doutra porra, fomos pra Tribunal) e ele apresenta-se a dizer que é pobre, que não tem dinheiro. E, a Caixa passou-lhe um papel a dizer que vai-lhe pagar tudo por ele!

- Oh alma de Deus, isso é mentira. Isso não é assim.

- Pois assim é que é! Então se ele é industrial da cobrição – com três farfalhudos – como é que pode apresentar um papel a dizer que é pobre? E, a culeta onde é que está! Não vale nada? Só pode ser coisa de compadres. É o que é!

 

O rapaz – rapaz do meu tempo – precisava de desabafar. Desabafou. Mas senti que não ficou lá muito convencido. Mas enquanto o ouvia, o meu disco rígido ia-me dizendo “ele tem razão”. Há lei para tributar tais os serviçosde barrasco. Mas deixe-se viver o empresário que ganha a vida qual Zézé Camarinha! E este que vai à televisão propagandear o que faz às “bifas”. E acaso também é “quletado” pelos rendimentos daí obtidos?

 

Os que deviam de ver, não vêm! E, também não ouvem. E passa tudo por uma risota! Ou não é? Então que possamos rir, por muito tempo.

 

 

Leiria, 2009-08-27



publicado por Leonel Pontes às 11:20
Sexta-feira, 14 de Agosto de 2009

Se pedirmos a alguém: fale-me de activos. Invariavelmente, a resposta dada é; terrenos, edifícios, máquinas, carros, aplicações financeiras, dinheiro. Nunca dizem “pessoas”.

 

Mas, se de pronto questionarmos: e pessoas, o que são? Invariavelmente, também, a resposta é: pessoas são “recursos humanos”. Bem! As pessoas podem ser, e são, uma e outra coisa.

 

São recursos humanos se estivermos a falar de disponíveis para assumir compromissos; emprego, função, trabalho, missão, desafio. Mas, assumido que seja esse desiderato, desde logo as pessoas passam a ser um “activo”.

 

E é importante que se saiba isto? É! É importante porque, é a partir dos activos humanos que se gera riqueza, que se cria e se inova, que se promove o desenvolvimento, o progresso, e até novos activos.

 

Mas, a nossos olhos, há na sociedade portuguesa um fraco sentido de responsabilidade, as pessoas estão sempre à espera que alguém por si assuma responsabilidades, ou lhes diga o que hão-de fazer. Ora com este tipo de acção, em vez de estarmos a ganhar riqueza, para o nosso bolso ou para a sociedade, estar-se-á a empobrecer. Os activos não valorizam o produto e/ou o serviço.

 

Por outro lado, há na cultura anglo-saxónica a figura do good-will que valoriza, dá expressão matemática até, quanto a empresa, ou o organismo valem. As empresas, as organizações, não valem só pelos terrenos, pelas máquinas, mas valem também e sobretudo pelos seus activos humanos. Good-will final.

 

Mas em boa verdade não são só as empresas que valem pelo seu good-will. Todos aqueles que estão afectos a uma função económica, directa ou indirectamente, todo aquele que faz girar uma autarquia, um hospital, aqueles que estas são afectos à administração da coisa pública, todos esses devem, e têm, de acrescentar valor à entidade.

 

Desde a mais pequenina associação de bairro, à maior empresa, passando pelos organismos de administração da coisa pública, as pessoas que fazem girar essas organizações, são activos. E, o que se espera de um activo é que renda, é que produza, é que traga a sociedade valor acrescentado. De outro modo é um peso morto.

 

Aquele que faz acuso perante a entidade judiciária sobre a gestão da sua empresa, empresa que lhe paga, empresa que o valoriza, empresa que lhe dá importância, este “activo” não traz valor acrescentado. O melhor é livrarem-se dele. Ah mas a lei diz que se pode fazer denúncia de crimes públicos. Pode! Mas, acusar porque se quer acusar! Este nem é um “activo”, nem é um “recurso humano”.

 

E aquele outro que aspira a ser governante que recebe e dá descaminho a coisa de suma importância para outrem, aquele que procura na sombra cercear caminhos de outrem, este também não é “activo” nem “recurso humano”.É um sempre em pé, a tudo se adapta. É qualquer coisa sem classificação.

 

Em suma, o país será tanto melhor, tanto mais desenvolvido e de progresso quanto melhores forem os activos que o servem. Se os activos deste país não perceberem isto, que têm de servir a sociedade com lealdade, postura, empenho, trabalho, honestidade, então, continuarão a comer do esforço dos outros e estarão a levar o país cada vez mais para a falência.

 

Leiria, 2009-08-14



publicado por Leonel Pontes às 12:45
A participação cívica faz-se participando. Durante anos fi-lo com textos de opinião, os quais deram lugar à edição em livro "Intemporal(idades)" publicada em Novembro de 2008. Aproveito este espaço para continuar civicamente a dar expres
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