”O mundo tem recursos suficientes para atender à necessidade de todos, mas não a ambição de todos”
Mahatma Gandhi (1869-1948)
A sustentabilidade é a garantia do futuro das pessoas, a qual pode ser definida como uma preocupação presente com o impacto das ações presentes no futuro. Tais preocupações devem ser refletidas no planeamento estratégico das empresas sustentáveis.
Intenções estratégicas dessa natureza são operacionalizadas através da adoção de um enfoque de longo prazo e de um conjunto abrangente de responsabilidades com foco nas práticas éticas, nos colaboradores, no meio, nos clientes e nos demais stakeholders.
A preocupação com a sustentabilidade, constituindo objeto de estudo relativamente recente, é uma problemática antiga. Com efeito, apenas as ações sustentáveis dos nossos antepassados nos permitiram ter presente, este presente. A contabilidade e o reporte que os contabilistas fizeram ao longo dos anos constituem um acervo de informação acerca das ações sustentáveis do passado. Portanto, uma primeira ideia é que foram as ações sustentáveis do passado que nos colocaram hoje, aqui.
Por outro lado, a sustentabilidade não constituiu uma preocupação exclusiva das empresas, mas antes das mais variadas tipologias de agrupamentos de pessoas, como por exemplo, dos Estados, das organizações supra estatais, das universidades e das ordens de classe.
Nesta linha, Lindmark (2012) estudou o desenvolvimento sustentável da Suécia entre 1850-2000, procurando identificar fatores que contribuíram para os períodos de maior crescimento sustentável. Conclui que os investimentos em capital humano, a melhoria das condições sanitárias, a redução da delapidação dos recursos florestais e investimentos significativos em infraestruturas, permitiram a sustentabilidade do crescimento.
A sustentabilidade é, deverá ser, uma preocupação de política empresarial, e de política dos políticos, conforme ficou demonstrado na IX Conferência de chefes de estado e de governo da CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa) que decorreu no dia 20 de Julho de 2012, em Maputo, Moçambique. Procura-se a sustentabilidade através da cooperação nas áreas da educação, saúde, ciência e tecnologia, defesa, agricultura, administração pública, comunicações, justiça, segurança pública, cultura, desporto e comunicação social.
A sustentabilidade é, portanto, um tema lato, que abarca todas as áreas da intervenção humana. Procurando delimitar esta reflexão, ocupam-se estas palavras da sustentabilidade empresarial. No entanto, também esta, a sustentabilidade empresarial, se constitui ainda como um tema vasto, o que aliás se conclui pelo muito que sobre o tema se tem investigado.
Simnett (2009) conclui que as empresas de grandes dimensões publicam cada vez mais relatórios separados de sustentabilidade. Alguns destes são auditados de forma independentemente por auditores financeiros ou por outras entidades. Este aumento de divulgações decorre da necessidade das empresas aumentarem a credibilidade. Roca (2012) procurou identificar os indicadores usualmente divulgados em relatórios de sustentabilidade corporativa. Para o efeito, estudou a realidade de 94 relatórios de empresas Canadianas. Os resultados mostram a utilização de um total de 585 diferentes indicadores. Aliás esta proliferação de estudos não ocorre apenas nos países desenvolvidos. Por exemplo, Mahadeo et al. (2011) analisa as divulgações sociais efetuadas nos relatórios anuais das empresas cotadas africanas (Mauritânia) entre 2004 a 2007.
Estes estudos demonstram que os relatórios de sustentabilidade são utilizados para credibilização, que tanto surgem integrados com os relatórios financeiros, como separados, que incluem sobretudo indicadores não financeiros, os quais são muito diversos, e que usualmente as empresas que apresentam relatórios de sustentabilidade credíveis apresentam igualmente resultados financeiros de qualidade. Importa notar, que a maioria destes estudos ocupa-se das empresas com títulos admitidos à cotação, as usualmente designadas empresas cotadas, ou listadas.
Contudo, o mundo empresarial em Portugal, na Europa e um pouco por todo o mundo, é constituído maioritariamente por pequenas empresas. Apesar de individualmente se apresentarem socioeconomicamente pouco relevantes, quando observadas como um todo apresentam-se significativamente mais importantes que as grandes empresas com títulos admitidos à cotação. Em 2008 representavam na Europa 99,8% do número total de empresas, empregavam 67% da população ativa e contribuíram com 58% para o Valor Acrescentado Bruto (Eurostat,2010). Esta evidência demonstra a relevância destas empresas, a qual é válida à escala mundial. Nos países desenvolvidos as PME constituem entre 80-95% do total de empresas (Devi,2003). Uma análise comparada permite verificar que nos EUA, em 2007, 99,6% das empresas empregam um número igual ou inferior a 100 colaboradores (U.S. Census Bureau,2007), enquanto na UE mais de 99,8% das empresas emprega menos de 250, demonstrando que a quase totalidade se qualifica como pequena ou média.
Estas empresas não cotadas estão obrigadas, pelo menos na Europa e designadamente em Portugal, ao reporte de vasta informação financeira, e também não financeira, designadamente através do relatório anual de gestão. Esse relatório, para além de incluir referências aos recursos humanos, ao desempenho económico, ambiental e social, de divulgar a estrutura de governance da empresa (usualmente gestores proprietários), inclui as perspetivas de futuro e de continuidade, incluindo indicadores financeiros e não financeiros, indicadores retrospetivos e prospetivos. Se, entre o mais, um relatório de sustentabilidade se caracteriza por incluir indicadores não financeiros e de caracter prospetivo, então um relatório de gestão, nos termos enunciados, é também um relatório de sustentabilidade. É pois lícito afirmar, que as empresas portuguesas, estão já obrigadas a apresentar um relatório de sustentabilidade integrado no seu relatório financeiro.
Esta circunstância está, contudo, prestes a mudar. Na Europa, em geral, as pequenas empresas estão sujeitas a exigências idênticas (Relatório de Gestão, Balanço, Demonstração dos Resultados e Anexo) às aplicáveis às grandes empresas, suportando desta forma gastos de cumprimento idênticos. Considerando que uma parte dos gastos administrativos é fixa, as micro-entidades sacrificam, relativamente às empresas de maior dimensão, os mesmos recursos para cumprir as obrigações decorrentes dos normativos contabilísticos, pelo que os custos de cumprimento são proporcionalmente mais elevados nas micro-entidades. Enquanto uma empresa, com menos de 10 empregados, para cumprir determinada obrigação despende 1 euro, uma com mais de 500 empregados, despende 0,1 euro. Esta natureza fixa dos custos de cumprimento decorre, da menor eficiência dos pequenos negócios em lidar com a regulação e da circunstância de muitas vezes ser o próprio empreendedor a tratar de assuntos administrativos, subtraindo-lhe tempo para dedicar ao negócio (Comissão Europeia, 2007).
Num trabalho elaborado para a Comissão Europeia pela CapGemini et al. (2010) concluiu-se que o custo médio por empresa europeia do cumprimento dos requisitos constantes das diretivas contabilísticas é de 1.558 euros, dos quais, 1.169 euros correspondem a recolha e processamento de informações apenas para satisfazer as obrigações jurídicas e sem utilidade efetiva para a gestão das empresas.
Estas circunstâncias determinaram uma política europeia de redução e simplificação da divulgação de informação. A simplificação para as micro-entidades (empresas abaixo de 2 dos 3 indicadores, ativo inferior a 350.000 euros, volume de negócios abaixo de 750.000 euros ou menos de 10 colaboradores), resultante da Diretiva 2012/6/UE, consubstancia-se, entre o mais, em isentar as referidas empresas de elaboração e apresentação do relatório anual de gestão. Considera a União Europeia, que para estas empresas, o custo de prestar informação financeira descritiva, através do relatório de gestão, é superior ao benefício que essa informação acarreta. Importa notar, que para as restantes empresas não cotadas, o caminho europeu é também o da simplificação. Assim, para empresas de menor dimensão, se até os relatórios de gestão deixam de ser obrigatórios, muito dificilmente estas, as empresas, compreenderão os benefícios de elaborar e divulgar relatórios de sustentabilidade.
Cremos, contudo, na linha das políticas da União Europeia, que os relatórios não são imprescindíveis. Imprescindíveis são os princípios que é suposto os relatórios veicularem: ética e enfoque no consumo responsável dos recursos, sem comprometer a capacidade das gerações futuras suprirem as suas próprias necessidades.
* Extrato de comunicação proferida no 3º encontro luso-brasileiro de Contabilidade que decorreu nos dias 22 e 23 de Outubro findo, na cidade S. Luiz, Maranhão.
Leiria, 2013.05.17