Sábado, 02 de Fevereiro de 2008

Há algum tempo atrás, alguém que viesse a terreiro dizer que a banca, e alguns banqueiros, iriam ser tema de muita conversa de café, de notícia de jornal, de telejornal, de denúncia, se alguém dissesse que uma tal criatura, honrada até à medula, geria sem ética, o dinheiro confiado aos seus bons ofícios; alguém que ousasse dizer, fosse o que fosse, sobre tão respeitável criatura e, outrossim, sobre tão impoluto banco – que era tido como um caso de estudo – esse alguém, só não seria enforcado porque em Portugal não há pena de morte; felizmente. Mas, no mínimo seria condenado por blasfémia.

 

E, eis que, qual língua mais entaramelada, sai a terreiro e consegue fazer perceber que alguma coisa andava mal em tão vetusta casa. No mínimo ficou-se a saber que por ali as contas não eram contas, antes e tão-só, eram números. E, quando os números não conseguem expressar tudo, devê-lo-ia dizer, inequivocamente, a prosa, o relatório de gestão.  Escondeu-se a verdade e fez-se, contabilidade criativa. E, quem devia fiscalizar negligenciou.

 

Mas, a crise foi remediada - só remediada - pois, a meu ver, a emenda foi pior do que o soneto. E, não fora, o meu país andar tão falado, nada diria. Mas, tenho o direito de opinar, de comungar da discussão pública das misérias em que o país mergulhou, por obras de nobres figuras.

 

Um dia destes durante as IV Jornadas da História da Contabilidade – o que eu perdia se não tivesse participado – colega estudioso, trouxe à discussão da classe acontecimento histórico sobre a falência do Banco do Minho (1865-1930) que fora criado por decreto régio ante parecer do Ministério das Obras Públicas endossado ao Rei D, Luis “apesar dos receios de se estar a permitir a multiplicação de entidades…  com possibilidade de emitir notas à vista e ao portador (dinheiro), o Conselho julga que enquanto factos importantes não demonstrarem, os perigos do caminho agora seguido, o Governo de Vossa Majestade não pode… deixar de conceder a qualquer nova associação bancária os mesmos direitos que a outros tem sido concedidos por lei e decreto-lei” E, quem tinha a capacidade de decretar, decretou.

 

E quem eram os donos do novo banco, eram homens hábeis e ainda os provindos do Brasil. Os abrasileirados conhecidos ao tempo por “empreendedores”. O que mais relevava à época – tal como agora – era o dinheiro, as regras de relevância contabilística, pouco importavam. E, muita criatividade se fez, inclusivé operações sem suporte, o que, obviamente, viria a dar bronca, como sempre acontece, ainda que se não queira, fica sempre o rabo de fora.

 

Entretanto, com alguma crise à mistura, o banco começou a ter dificuldades financeiras e fora pedida ajuda (apoio) ao Ministério das Finanças. Mas, em 1928 Salazar chega ao Ministério. Inteirando-se da situação, conhecendo as criatividades, outra opção não teve senão dar xeque-mate, por DL 19583, ao Banco do Minho. Digamos que o governante, por uma vez, esteve bem. Ou, se fazem as coisas cumprindo regras, ou se dá morte às habilidades.

 

Voltando ao princípio da história. Quem perdeu com a miserável história do BCP? Foram os pequenos accionistas. E, ao tempo do Banco do Minho quem perdeu? Foram os pequenos investidores. Ah, mas naquele tempo a falência de um banco deixava muita gente de rastos! Pois deixava. Mas curava-se o mal pela raiz. E agora? Agora remedeia-se e perdemos tempo a discutir o sexo dos anjos, qual católico mais fervoroso e temente a Deus, que vai todos os dias à missa, com uma reforma mensal de 100 mil euros no bolso, ou sejam 20 mil contos. Isto também é pecado. É o pecado da gula, oh Sr. Jardim. Tenha vergonha e faça (sem favor) uma dádiva mensal, pelo menos de metade a instituição de beneficência, sob pena de ser condenado ao inferno, já que por este mundo andamos parcos de justiça.

 

Leiria, 2008.02.02



publicado por Leonel Pontes às 23:46
A participação cívica faz-se participando. Durante anos fi-lo com textos de opinião, os quais deram lugar à edição em livro "Intemporal(idades)" publicada em Novembro de 2008. Aproveito este espaço para continuar civicamente a dar expres
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